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88 - (NH2)2CO
segunda-feira, 24 de maio de 2010


Apesar de ser solitária e fraca a luz da lanterna, Tony seguia sem dificuldades a trilha que Johnny lhe indicara.
Quando se está sozinho numa floresta escura, rumando deliberadamente ao perigo, é inevitável que não se serpenteie nas ideias toda uma sincera análise do que se foi e do que será. Nunca fora popular, nunca tivera amigos, namoradas ou qualquer coisa de especial, se não um inquestionável dom com computadores. Aos dezesseis anos Tony já havia desenvolvido mais softwares que 60% das empresas do ramo e com isso ganhara muito dinheiro. O destino da fortuna? Sua segunda paixão, Deus. Talvez por uma combinação das duas ele se encontrava ali agora, mais uma vítima mergulhada na loucura do St. Jimmy. Desrespeito aos valores morais, falta de companheirismo, falta de amor ao próximo, caos social, descomprometimento total com a tradição puritana; uma bomba e um assassino. As causas e as consequências eram facilmente confundidas na tempestade. Tempestade que por obra divina fizera vir cair em sua mão uma novíssima nota de cem, uma linda e meiga garota de cabelos laranjas e charmosas sardas. Tinha certeza, o amor e a palavra do Senhor o tornariam invencível e o bem triunfaria. Ele iria pegar o serial killer- que por maior que fosse a redundância , Tony só se satisfazia adicionando a ele o adjetivo louco- iria achar a bomba e como em seu mais divertido passatempo iria desarmá-la. E depois disso tudo iria conquistar o amor, ah o amor. Por vezes isso, por vezes o medo faziam suas pernas tremerem enquanto ziguezagueava, ondulando a grama, pelas plantas a observarem-no e sussurrarem com a a ajuda do vento:
-Boa sorte.
Um ponto luminoso foi tornando-se cada vez mais distinguível conforme Tony avançava. Inconfundível foi a voz:
-Quem é você?
-Sou Tony – respondeu prontamente conforme o ensaiado – Travis me mandou. Pediu para avisar que não vai poder vir, parece que Ele tem outros planos pra ele. Disse que você me diria o que fazer.
David não parecia convencido, fitou atentamente o garoto que lhe viera: ligeiramente acima do peso, provavelmente judeu, era quase tão inútil quanto um Meyer, não parecia ser do tipo que Ele aprovaria. Seria mais um dos planos bobos de Johnny? Farejou o ar. Fedia como tal:
-Não há nada para fazer aqui até que apareça algo para fazer e caso apareça não acho que você vai ser muito útil.
-Tudo bem, eu posso ficar, não se preocupe. Posso te fazer companhia – que desculpa era aquela? Pífia sem dúvidas, mas o fato de Tony estar prestes a delegar ao comando do sistema nervoso parassimpático o controle de sua bexiga era um bom argumento.
Como uma aranha- que tem sua vítima totalmente dominada, esperando a inevitável morte, presa à teia - David se aproximou do menino que estava prestes a se mijar, era hora de digerir sua refeição. Num tom de voz que o fazia divertir-se por dentro sibilou:
-Eu não me preocupo. Eu não confio em você e a não ser que Ele diga alguma coisa diretamente para mim, não confiarei. Se quiser ficar, fique, não ouse, no entanto falar comigo, me olhar ou sequer pensar em mim. Não preciso de você. Se me desobedecer, vai fazer companhia àqueles filhos-da-puta ali.
Tony viu os alunos amontoados do outro lado tenda. Tende piedade deles senhor, pensou antes de engolir em seco e sair trêmulo para sentar-se num canto. Precisava pensar. Tudo havia dado errado. Só lhe restava orar. Isso foi o que pensou antes de ouvir a seu lado uma arma ser engatilhada. O garoto a seu lado sorriu diabolicamente:
-Eu disse para não pensar em mim. E, além do mais isso aqui – balançou a arma sorrateiramente – está pesando no meu bolso há algum tempo, implorando para ser usada. Não acho que uma bala vá fazer falta.
Tony sentiu o cano gelado encostar em sua testa. Viu a insanidade nos olhos de seu assassino, em momento algum duvidou das palavras dele. Os pensamentos voaram, queria agradecer Deus por tudo que lhe dera, mas foi numa graciosa ruiva que sua mente foi parar. Ainda ouviu David zombar:
-Faça seu último pedido cowboy!
Agora era oficial, e o cheiro de urina denunciava isso.


Música: Enter Sandman - Metallica

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