A cena se repetia. Reunião na singular e última sala do terceiro andar. Johnny, em pé, falava para quase os mesmos ouvintes. Faltavam Linda e Meyer; Charlie, Lichba, Andy e alguns recrutas de boa vontade e saco cheio de tudo aquilo compensavam a ausência. Diferentemente da anterior, quando Johnny optara por uma apresentação mais dramática, desta vez havia muita luz, fato que fazia transparecer mais facilmente ainda o nervosismo:
-Não consegui achar Meyer – explicou-se Sneer.
-A biblioteca sempre é um bom lugar para se esconder – brincou Johnny.
Assim que o sorriso se foi veio a incomum voz séria. A tensão estava no ar:
-Hoje de manhã cinco pessoas não acordaram. Simplesmente não acordaram. Foram dormir ontem a noite e hoje de manhã estavam expelindo sangue e outras coisas apetitosas por todos os buracos possíveis e impossíveis. Sequelas, como nossa querida Lichba bem me disse, do uso excessivo de uma combinação de drogas encontradas em qualquer farmácia ou enfermaria.
A garota sorriu, a única novidade naquilo tudo era ouvir Johnny falando de forma polida e sem nenhum cigarro na boca. Havendo silêncio, a voz rouca do garoto prosseguiu:
-No dia primeiro de abril oito pessoas foram sequestradas, entre elas Linda Twin. Sumiram também substanciais quantidades de comida e calmantes, fato que me faz crer que felizmente nossos amigos estão sendo mantidos vivos. Não sei até quando e nem por que, mas tenho a incomoda sensação de que logo descobriremos. Tudo depende de até onde pode ir a loucura Dele. Por isso apelo para que sejamos breves.
Foi Lyla quem fez a pergunta entalada na garganta da maioria ali:
-Quem é Ele?
A loira sentiu-se tola. Imaginou que, assim como na maioria dos assuntos, ela era a única que ignorava aquele:
-Não sei... – começou Johnny – mas sei que Ele existe. Tenho um palpite, contudo, o campo da subjetividade não nos interessa, deixemo-lo para quando ele for nossa única chance e apeguemo-nos aos fatos. - a qualquer momento o vocabulário de Johnny iria deixar todos mais estupefatos que o terror que se desencadeava no St. Jimmy. - Charlie notou que três garotos se revezam entrando e saindo da floresta todo dia, em turnos de oito horas. Sabemos também que David Courtney está do lado inimigo e provavelmente configura como o braço direito Dele, gerenciando o empreendimento durante o dia todo...
-David não pode ser Ele? - interrompeu uma garota de voz irritantemente fina com a qual Johnny transara e que desaprovara. Ela, no entanto, esperava ávidamente pela sua segunda chance, utilizando-se de todos os artefatos fúteis para conseguí-la.
-Pode – admitiu Johnny – mas acho extremamente improvável devido a uma incrível quantidade de incompatibilidade de fatos. Acredito que haja no mínimo um grau hierárquico acima dele. -a garota sorriu satisfeita com sua participação, permitindo ao menino, logo após exibir um mapa mal desenhado, continuar – Na floresta existem três grandes clarões – enquanto falava ele indicava círculos disformes dentro de um grande retângulo que representava justamente a floresta – sendo um deles muito próximo de onde Linda estava quando sumiu. Meu plano é: iremos até lá; na hora da troca de turnos sequestramos um dos capangas e substituímos por um de vocês – ele apontou para dois recrutas-de-boa-vontade-e-saco-cheio-de-tudo-aquilo que imediatamente estufaram o peito prontos para servir – então vocês distraem quem estiver lá, desviando o foco de atenção deles e dando tempo para o resto de nós agir. Só tomem cuidado porque eles provavelmente estarão armados e pouco amigáveis – concluiu Johnny, fazendo murchar a disponibilidade inicial
-E se não der certo? – emendou a voz seca de Sofia.
-Tem que dar certo, quem pensar o contrário que fique aqui. Esse é o começo do fim.
Música: Look What Happened - Less Than Jake