Linda saiu lentamente do bosque e se encaminhou aos sorrisos para o prédio principal, no caminho encontrou apenas um menino bonito e simático que a cumprimentou com um leve aceno. Fez o possível para fugir da irmã, ainda não tinha certeza se compartilharia com ela o que acabar de ouvir.
Em pouco tempo e muitos passos chegou ao dormitório feminino que se encontrava quase deserto, as últimas garotas estavam de saída para o refeitório. Após um banho, aproveitando a fome que a acometera, ela fez o mesmo.
Lá chegando logo se espantou com a intensa movimentação. Diferentemente do primeiro dia, hoje haviam animadas conversas, exaltadas conversas e discaradas paqueras. Serviu-se de legumes, saladas e uma farta porção de batata frita e sentou-se numa mesa metálica e vazia. Não demorou para que Sneer viesse lhe fazer companhia. Após pegar uma batata exageradamente salgada perguntou numa voz carregada de curiosidade:
-E então, como foi com nosso amigo?
Linda ainda não parara para pensar no que diria a ele, agora começava a entender o que Johnny lhe dissera. Mastigou um brócolis um pouco mais que o necessário na tentativa de organizar o pensamento:
-Nada mal. Aliás ele te mandou isso. - e colocou um cigarro em cima da mesa – disse que se você quiser mais é só procurá-lo no bosque. Aparentemente é isso que ele tem feito.
-Aparentemente? Precisamos ter certeza do que ele faz lá. Johnny pode ser o assassino, você não percebe como é fundamental saber o que ele faz escondido no meio daquele mato?
Nada iria atrapalha o bom humor de Linda, nem os chiliques de Curinga.
-Bom, para a sua alegria, Johnny disse que estaria aqui para o jantar, ai você pode descobrir por você mesmo o que ele tem feito. - Ela se divertia imaginando a tentativa, ainda mais porque Sneer se animara com o fato, tanto que até arriscou pegar mais uma batata. Saiu tossindo atrás de um copo de água, mas não sem antes exclamar:
-Hemodialise segunda porta à esquerda.
O refeitório foi se esvaziando e Johnny não chegava, Linda ficou acompanhando a irmã que terminava de comer um macarrão extremamente apimentado. Sneer dessa vez seguido por Meyer juntou-se à elas, sentando-se do lado oposto da mesa, deixando Lyla incomodada. A televisão ligada com a tela azul já não era mais motivo de atenção.:
-Parece que estamos nos acostumando ao St. Jimmy, as pessoas estão se unindo, achar a bomba é questão de tempo. - O colorido garoto fazia o possível para inspirar confiança – Creio que uma festa não nos faria mal.
A porta do refeitório se abriu e Johnny, com um dedão ensanguentado entrou no recinto.
-Se você quer festa, chegou a pessoa certa – disse Lyla num tom de paixão e desprezo.
-Ora, isso é tão clichê! - A voz esganiçada de Meyer foi comumente ignorada. Sneer que estava de costas para o garoto que acabara de chegar se virou e o viu fazer um variado e cheio prato. Em seguida Johnny se encaminhou à mesa onde se encontravam os outros quatro e abriu um lugar entre os outros dois meninos que se apertaram nas beiradas.
Imediatamente duas pernas começaram a roçar nas do recém chegado rapaz. Dois pés descalços acariciavam lentamente suas pernas em agradáveis movimentos. Ele espiou por baixo da mesa e viu que uma delas vestia uma longa saia xadrez e a outra uma apertada calça. Sorriu e olhou profundamente nos olhos de Lyla, em seguida fez o mesmo com Linda. Após isso exclamou:
-Mademoiselles.
Como num ritual começou a comer broncamente, usando as mãos no lugar de talheres. O sangue que escorria de seu dedo era mais um ingrediente no meio daquela indistinguível mistura. Voltou a falar com a boca ainda cheia de comida:
-Pelo visto não escapei da comida gelada.
Todos observavam abismados os modos (ou a falta deles) do garoto que voltou a encher o prato três vezes. Terminada a refeição soltou um longo arroto na cara feia de Meyer. Sneer exclamou:
-Boas novas para você, já chegamos ao século XXI - e deu seu sorriso irônico ao mesmo tempo que apontava para o relógio no pulso.
-Você deveria se importar mais com a bomba e menos comigo. Se essa merda explodir não acho que quem segue a etiqueta será poupado. - Os outros três figuravam como meros espectadores e somente agora as pernas haviam sossegado.
-E você está muito preocupado com isso! Fica plantando sua erva, isolado naquele bosque enquanto trabalhamos. - Para a alegria de Sneer, Lyla veio em seu apoio.
-É um vagabundo – Mas seu pé dizia outra coisa embaixo da mesa.
-O que posso dizer, sou um rebelde! - E riu largamente mostrando seus dentes sujos.
-Certo senhor rebelde – agora era Linda quem falava – está na hora de trabalhar – Todos olhavam para ela confusos. - E desta vez não haverá do que reclamar.
-O que quer que eu faça minha nobre dama?
- Queremos uma festa. Você vai organizar tudo, desde comida e bebida até música, instalações e toda merda envolvida. Se tiver sucesso, garantirá sua comida até o fim do mês, caso contrário terá que trabalhar para comer. - No entanto a ameaça presente em seus olhos foi amenizada por um carinhoso beliscão com o pé.
-É! - Apoiou toscamente Meyer como se estivesse no comando.
-Agora... - começou- vocês entenderão o motivo de me chamarem de Johnny FUN! - E após uma piscadela para Sneer saiu com o dedão pingando sangue não para o bosque, mas para o prédio principal, tinha assuntos importantes para resolver.
Johnny estava no bosque, mais que um escritório, aquele tinha sido seu lar durante a última semana. De lá se divertia vendo Sneer ir atrás do que ele já tinha, era tudo muito claro, porém pretendia aproveitar melhor essas férias bondosamente concedidas pelo St. Jimmy. Gostava de ser o fora-da-lei, mas em breve teria que aparecer, tomar o poder. Já começara a reunir adeptos para seu plano, a guerra com Curinga estava mais uma vez iminetne. Um amassar de folhas o desviou de seu pensamento, ninguém o avisara de uma visita mas a voz pareceu confirmar suas previsões:
-Johnny?
-Lyla?
No entanto não foi a loira quem apareceu, em seu lugar havia uma furiosa Linda, que sentou-se bem a frente do garoto:
-Estava esperando minha irmã? - o brilho felino de seus olhos atingia a mesma intensidade do de seu sorriso.
-Nem fudendo, confundi a porra das vozes, estou um pouco indisposto para brigar, sua irmã me persegue, não sei se sabe. - O garoto fazia o possível para ser passível de dó. Quase conseguiu.
-Ah sim, coitadinho – Por um momento Johnny viu um sorriso de Sneer na cara da garota, decidiu mudar o assunto:
-Que bons ventos te trazem? Não foi o Curinga, foi?
- Claro que foi, ou você acha que eu viria aqui por livre e espontânea vontade?
-Seria mais agradável.
-Seria uma mentira.
-Mentiras são agradáveis. - Isso punha um fim na questão, Linda o olhava diretamente nos olhos como se o desafiasse, ele particularmente adorava isso.- Então Sneer quer saber o que eu faço aqui?
-Ele é bem controlador.
-E o que você está ganhando para vir aqui? - A garota estava dividida entre falar a verdade ou não. - Não me diga que não é nada pois eu te conheço, sua irmã tem coração, você cérebro.
- E você adora o coração dela, não é mesmo? - As palavras simplismente saíram da boca da garota, como se estivessem lá a muito tempo, somente esperando para serem .
-Prefiro os peitos, embora os seus sejam maiores. - E riu.
Foi a gaorta que mudou de assunto dessa vez:
-Então o que você faz aqui?
-Estou procurando uma bomba. - Sua voz era surpreendentemente séria.
-Você acha que está aqui?
- Não se finja de tola Linda. Mentes inquietas tem ideias brilhantes e a sua é tão desassossegada quanto a minha, tente um palpite sensato, eu adoraria ver um suspiro de inteligência para variar.
-Você planta maconha aqui – e a garota apontou para o chão – mas não consome tudo e também não faria sentido vender – Johnny incentivou-a a continuar com um aceno positivo da cabeça. - Você as troca por favores e sexo?
-Sua última palavra quase destroiu uma brilhante análise. Nunca precisei pagar por sexo, isso é uma consequência natural das coisas, eu tenho o mel. - Dizendo isso abriu um largo sorriso -Pago por ouvidos, olhos e bocas que abasteçam essa belezinha aqui. - E tamborilou os dedos numa posicão pouco acima da orelha.
-Sneer não esconde nada de ninguém, não precisa pagar por ouvidos, pode usar os seus.
- O Curinga tem um bom coração, sei que ele não esconde nada dos outros, mas os outros escondem dele. Eu também não sei de tudo, mas sei mais que ele.
- E por que alguém esconderia algo ? Estamos juntos nessa. - A atividade cerebral da ruiva era intensa para processar toda a informação.
-Ah Linda, é uma bosta ter que explicar as coias, principalmente para pessoas como você que tem a capacidade de descobrirem sozinhas. Sua sorte é que você frequenta meus sonhos – A garota demonstrava estar profundamente enojada – Aquela merda de Sneer de poder e desigualdade é a pura verdade. Em uma semana ele liderou vocês numa merda duma busca pela merda da bomba e não achou porra nenhuma. O ego de algumas pessoas não gosta de ser subordinado a alguém que elas julguem inferior, por isso acabam tentando resolver tudo por si próprias. A glória é tentadora, você deveria experimentar.
-Então você acha que as pessoas estão mentindo pra ele?
-Não, elas estão omitindo. - Houve silêncio, Johnny dava tempo para as engrenagens cerebrais de Linda trabalharem. Por fim ela concluiu:
-É uma teoria.
-Se gosta assim, eu prefiro chamar de verdade. - As palavras dele pareceram encerrar a conversa, mas obviamente Linda precisava saber mais e ficou esperando que o garoto tomasse alguma atitude. E foi exatamente o que aconteceu, o show ainda não chegara ao clímax. - A guerra com Sneer está novamente no ar. Eu gosto dele, mas mais uma vez ele está no meu caminho. No caminho do bem maior.
-De novo? Mais uma vez? - Os temores e esperanças da garota vieram a tona. Todas as suspeitas foram comprovadas quando Johnny tirou a camiseta polo que usava. Numa das costelas havia uma cruz de malta, no ombro direito uma cicatriz denunciava uma antiga queimadura. No peito esquerdo um trevo de quatro folhas extremamente igual ao que Lyla levava no pescoço.
Música: Hero of War - Rise Against
Marcadores: Johnny Fun, Lyla