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56- Ato II, Cena 2
quarta-feira, 30 de setembro de 2009


"Vamos porra, se mexam caralho, partam para a briga seus merdas!"
Pensava Johnny enquanto era amarrado pelo capanga que o derrubara e o imobilizara. No entanto, tão logo olhou para o lado, tão logo tornou-se claro a falta de ações.
Fionna agarrara Lyla pelo cabelo e colocara ameaçadoramente uma faca na garganta da loira. Johnny sabia que corria esse risco desde o início, jogara com as probabilidades. Sentiu-se um tolo. Teve raiva de si mesmo. Ele fodera com tudo e Linda estava certa, ele não passava de um filha-da-puta egoísta:
-Então Lindinha- começou Fionna - perdeu o namorado e agora vai perder a irmã. Que noite mais triste não é mesmo? - riu - Mas antes, quero que conheça o culpado por isso tudo. - A garota apontou na direção de Johnny.
Pela primeira vez todos os olhos estavam nele, no plano original, isso só deveria acontecer quando ele salvasse Lyla. Fionna continuou:
-Se ele tivesse me dado o que eu pedi, nada disso teria sido necessário. Nem ele nem a loirinha teriam que morrer. Por falar nisso, serei democratica. Quem aqui acha que ele deve morrer primeiro? - e a própria garota levantou a mão, admiriando seu público indignado. Era a hora dela brilhar naquela peça.
O garoto que segurava Johnny empurrou-o para a frente. Como este tinha os membros amarrados, desequilibrou-se e caiu de cara nas folhas secas, misturando terra ao sangue que escorria do nariz.
Foi erguido pelos braços musculosos de Fionna. Olhou com nojo em seus olhos opacos e por fim cuspiu em sua cara. A garota pareceu gostar daquilo e lambeu a baba que escorria desde sua testa.
Johnny não sentiu medo quando Fionna começou a brincar com a lâmina gelada em seu pescoço.
Percorreu com o olhar Linda, Sneer e Sofia. Por último seus olhos cruzaram os de Lyla pelo que pareceram anos. Lembrou-se de como se conheceram naquele elevador de hotel, de quando a loira lhe devolvera o trevo no alto daquela rocha. Lembou de como o vento bagunçava gazeteiramente suas mechas douradas, sem no entanto que ela se importasse com aquilo.O brilho dos olhos dela era exatamente o mesmo pelo qual se apaixonara. Pode sentir o cheiro do mar naquele que julgava ser o último ar a entrar em seus pulmões.

-Não! - Ouviu ainda a voz de Sofia gritar em vão.
E o segundo ato termina, sem a certeza de que um terceiro virá.

Música: Hallelujah - Jeff Buckley



55 - Ato II, Cena 1
domingo, 27 de setembro de 2009


Johnny havia perdido Linda de vista assim que esta abandonara o prédio principal. Acreditava que do jeito dela, a garota havia entendido o recado e no fundo a considerava ainda mais sexy quando estava brava. Saiu para a noite, com o ignorável Meyer, muito cheio de si, em seu encalço.
Os dois se encaminharam por trás do prédio principal num atalho que o menino bobo desconhecia. Contornaram-no calados, passando por um corredor longo e muito apertado.
Quando puderam avistar o bosque e Linda, Johnny fez um gesto com a mão para que parassem. Voltaram a se mover assim que, poucos minutos depois, ouviram a ruiva gritar:
- Filha-da-puta!
-É um doce – comentou Johnny em voz baixa, abafando uma risada.
Seguiram por trás de algumas árvores até que um garoto os viu. Era David:
-Cadê Andy? - perguntou Johnny de prontidão.
-Boa pergunta Acho que sumiram com ele – de certo modo não estava mentindo – eles estão em dois, mais a garota, se é que posso chamá-la assim - relatou - Por aqui.
Seguiram numa trilha complexa que Meyer teve sérios problemas para acompanhar. Ao fim de dez silenciosos minutos pararam. O coração de Johnny acelerou.
Lá estava Lyla, a poucos metros dele, com as mãos e os pés amarrados, a boca colada com uma fita adesiva e profundamente assustada, mas ainda assim linda. Dois homens musculosos montavam guarda, contudo pareciam extremamente absortos com algo que se passava pouco a frente.
-É a nossa hora. - sussurrou Johnny – Eu e o David pegamos os grandalhões e o Meyer fica com Lyla.
-Devo bater nela também? - perguntou o garoto animado.
-Não idiota, você foge com ela. - A resposta de Johnny veio sucedida por um tapa na nuca.
Porém, antes que ele pudesse discordar da parte em que fora chamado de idiota e agredido, Johnny e David partiram silenciosamente até chegarem a menos de um metro do alvo. Então tornaram a se esconder atrás das árvores próximas.
Os dois guardiões assistiam destraídamente à confusão que se passava logo em frente. Ao ver Lyla, os olhos de Johnny brilharam, mas ele não podia desviar sua atenção, não era uma boa hora para isso. Fez uma contagem regressiva com os dedos e quando sua mão tornou a se fechar partiu furiosamente para cima de um dos inimigos. Agarrou sua cabeça, sem que ele tivesse chance de se virar, e bateu-a fortemente no tronco de uma árvore. O rapaz cambaleou e caiu de lado, mas ainda consciente.
No entanto, antes que pudesse olhar de lado com a intenção de ver como se saíam seus parceiros, foi atingido por uma joelhada nas costas que o fez curvar-se. Em seguida um soco certeiro e sentiu seu nariz sair do lugar. Com a língua provou do próprio sangue que escorria. Caiu na relva a tempo de ver Meyer ser jogado para longe pelo capanga cuja testa sangrava.
Foi quando Fionna entrou em cena. Atrás dela, imóveis estavam Linda, Sofia e Sneer.


Música: Restless Heart Syndrome - Green Day



54 - Ato I
sexta-feira, 25 de setembro de 2009


A voz de Linda fez com que o casal se levantasse sincronizadamente. Sneer estava pronto para fazer despertar o artista que havia dentro dele; Sofia, no entanto, não tinha tanta certeza que aquilo tudo era encenação.

Ouviu a ruiva se aproximar, à passadas firmes que faziam a grama gemer, e empurrar Sneer de volta para o banco, onde o garoto ficou obedientemente assistindo à conversa:

-Então era esse o fim que você daria? - a vermelhidão de seus cabelos se espalhava por todo o corpo.

Sofia calou-se por alguns instantes. Estava atordoada. Sentia por Linda uma paixão explosiva, e além do mais havia prometido para a garota que o caso com Sneer não passava de um favor para o irmão. Contudo agora, ela já não estava mais tão certa disso, estar com ele a fazia sentir-se segura em meio àquele caos. Foi o que tentou explicar:

-Eu já não sei mais! Gosto de você e gosto de Sneer... – e apontou para o rapaz que parecia se divertir, para ele aquilo tudo não passava de encenação. - eu não quero ter que escolher, eu quero viver! - conforme falava a morena ia ficando cada vez mais pálida.

Ao ouvir aquelas palavras Linda entrou em choque. O filme se repetia: confiara em alguém, se apaixonara por alguém e essa pessoa frustrara seus sentimentos em tempo recorde. A única diferença é que dessa vez fora trocada por um homem. Indignou-se:

-Eu deveria saber, é mal de família! Maldito o dia em que esses malditos portões se abriram malditamente!

Sofia ficou sem ter o que falar, mas nem precisou, uma voz desdenhosa veio colaborar para a impaciência de Linda:
-As coisas não estão dando certo, Lindinha? - a face feia de Fionna surgiu atrás de Sneer que tornou a se levantar assustado.
E assim terminou o primeiro ato. Sem que se soubesse quem interpretava e quem vivia.

Música: Before The Lobotomy - Green Day





53- David e Andy
terça-feira, 22 de setembro de 2009


Andy e David estavam sentados num banco de modo que se mantinham invisives a Sneer e Sofia e principalmente a Fionna, no entanto, podendo ver estes com alguma dificuldade por entre o emaranhado de galhos. O primeiro garoto acompanhava sem muito interesse uma formiga que passeava por sua bota carregando uma folha que parecia ser pesada demais para sua fragilidade; o outro mantinha os olhares fixos no casal que começava a discutir. Suspirou numa voz mais alta que desejava:
-É uma bela garota a irmão do Johnny – ao ver que Andy erguia a cabeça na direção de Sofia completou – não acha?
A primeira coisa que veio na cabeça do musculoso rapaz foi Little. Como se não bastasse a menina aparecer por ali sempre que ele se encontrava sozinho, agora ela precisava aparecer também quando ele estava acompanhado? Costumava manter seus pensamentos em sigilo, mas assim como Johnny, David vinha se mostrando um bom amigo nas últimas semanas e sabia que podia contar com ele. Ponderou aquilo, escolhendo contudo uma resposta evasiva:
-Não sei não, mas se tiver herdado a mesma inteligência do irmão não é só com sua beleza que devemos ter cuidado.
- Parece ser uma boa garota – julgou David – por que não tenta?
Andy lançou longamente um olhar de avaliação ao amigo, pensando se deveria responder algo. Um sexto sentido lhe disse que não e ele acreditou:
- Não faz meu tipo.
- Prefere as pequenininhas de olinhos puxados né? - caçoou .
O olhar dessa vez foi de censura. David se assustou por um momento:
-Enquanto não pegar o corno que me tirou Little, ela continuará aqui – e Andy apontou determinadamente com o dedo indicador para o próprio peito. Mudando do tom sério para um mais leve completou – e você, por que não tenta?
-Eu não teria chance – pareceu pensar naquilo uns instantes e deu seu veredicto – não, esqueça! Eu? Nunca!
-Se você diz – conformou-se Andy – não deve ser muito bom ter Johnny de cunhado de qualquer jeito.
David pareceu achar aquilo engraçado, pois antes de responder tossiu uma risada:
-É. Se ele faz isso com quem ele come, imagina o que faz com quem come a irmã dele.
-Pois é – pensava em Lyla – pobre garota.
Mas ele não pode terminar de apiedar-se da loira, pois um grito flamejante cortou o bosque indicando que era hora de agir:
-Filha-da-puta! – Johnny alertara que o sinal viria em palavras que não faziam jus à voz. Andy discordou, nada podria combinar mais perfeitamente. Virou-se para o lado e chamou David:
-Vamos... - mas o garoto não estava mais lá.
Seus sentidos não foram rápidos o suficiente para perceber um conhecido bastão que o atingiu familiarmente na nuca. Apagou imediatamente.
David arrastou o corpo para trás de um arbusto próximo. Escondeu o bastão numa moita ao lado e saiu na direção de Linda. Mas não antes sem comentar com o corpo inerte:
-Desculpa amigão, mas eu vou sozinho.

Música: David Courtney - Rancid



52 - Linda e Johnny
domingo, 20 de setembro de 2009


Sneer e Sofia haviam abandonado a sala havia poucos segundos quando Johnny anunciou numa voz decidida:

-Linda, preciso falar com você, acho que lhe devo explicações.

Os dois ficaram olhando impacientes para Meyer que parecia não ter entendido a deixa. Provada a falta de capacidade mental do garoto a ruiva gritou numa voz histérica:

-Tira essa bunda gorda daqui otário!

Sem entender o motivo de tanta raiva o garoto saiu resmungando:

-Ah! Mas que clichê!

Quando a porta tornou a se fechar Johnny deu uma tragada no baseado recém acendido e com a voz disfarçada pela fumaça começou:

-Acho que devo desculpas a você e à Lyla – ao ver que Linda não parecia mais mansa acrescentou - Acredite, foi realmente doloroso pra mim fazer tudo aquilo.

Deu outra tragada e continuou, observando a ruiva impassível:

-Tudo que aconteceu por aqui no últimos dias foi culpa minha. O que rolou comigo, com você, com sua irmã e por que não com a minha e com Sneer foi tudo culpa minha. Mas como você é a mais esperta daqui, espero que se ainda não entendeu, que entenda. - A ruiva permanecia imóvel – tive que fazer com que vocês brigassem, com que nós brigassemos, ela e Sneer brigassem, pois só assim teríamos tranquilidade de uma vez por todas – outra tragada – com ela sendo sequestrada descobrimos o assassino do St. Jimmy, Andy me entrega a chave, pegamos a grana e não precisamos nos preocupar com mais porra nenhuma por um bom tempo. - ele parecia realmente convencido que aquilo fora o tempo todo o certo a se fazer.

Na tentativa de acalmar a fera ainda acresentou:

- Somos cinco. Temos três milhões mais a grana do ano passado. O que acha?

A ruiva tinha os olhos franzidos de raiva. Levantou-se a aproximou-se lentamente de onde estava Johnny. Aproveitando que o garoto olhava fixamente em seus olhos levou a mão até o meio das pernas dele e apertou firmemente o seu saco, até que as unhas cuidadosamente cultivadas por ela estivessem prestes a perfurá-lo. Pode ver os olhos dele começarem a lavrimejar, apesar de não haver qualquer outra manifestação de dor, tensão ou nem mesmo surpresa naquela face pálida. Colocou a boca nos ouvidos dele e sussurrou espinhosamente:

- Acho bom que isso de certo, seu egoísta filha-da-puta – e girou o punho torcendo dolorosamente os testículos de Johnny que por um instante mínimo franziu as sombrancelhas – caso contrário, você vai torcer pra que eu tivesse arrancado suas bolas agora.

Quando as mãos da garota afrouxaram ele soltou um brevíssimo e imperceptível suspiro de alívio. Em seguida, já com o sorriso bobo de volta ao rosto sugeriu:

-Se você descer agora poderá ver os dois se beijando. Ai você cumpre sua parte do plano.

Johnny só tornou a relaxar quando a ruiva sem mais nenhuma palavra virou as costas eabandonou a sala.


Música: Good Ridance (Time of your Life) - Green Day




51 - Sofia e Sneer
quinta-feira, 17 de setembro de 2009


Sofia e Sneer foram os primeiros a descer as escadas do terceiro andar e abandonar o prédio principal, rumando em direção ao bosque.O turbilhão de cores dele refletiam excelentemente a confusão que se passava em sua cabeça; já ela era exatamente o oposto: aparentava estar tranquila e serena, exatamente como o irmão. Ao avistar “la bela luna”, uma renovada auto estima fez o garoto falar:
-Então... você é irmã do Johnny, uau!
Sofia não respondeu, talvez porque aquilo não fosse uma pergunta, talvez porque apesar das palavras arranharem sua boca, clamando por poder experimentar o delicioso ar noturno que abatia o St. Jimmy, ela não sabia o que dizer. O que poderia dizer.
-Sabe, ele foi meu primeiro amigo – recordou-se Sneer – Fizemos grandes coisas juntas no ano passado. Grandes sim, mas terríveis. Costumávamos dizer que ele era a sabedoria e eu o conhecimento e que juntos eramos imbativeis. De qualquer jeito, ele transformou a minha vida.
Somente os sons abafados dos passos na grama vieram em resposta, mas o Curinga nunca se importara em matraquear:
-Talvez tenha sido isso que me impressionou em você, a grandiosidade. Vocês parecem sempre ter o controle absoluto sobre tudo que se passa, sempre estão um passo a frente de quem já esta á um passo a frente. Tudo isso é simplesmente...
Mas as palavras foram interrompidas pela visão de um vulto vindo do meio do mato. Somente quando ele se aproximou é que Sofia o reconheceu-o, tranquilizando Sneer:
-David!
Sofia, Sneer – fez um gesto com a cabeça indicando os dois – fiquem naquele banco – e apontou para um canto fracamente iluminado próximo ao clarão no qual Johnny costumava se hospedar – Fionna está no meio das árvores e pode tanto vê-los quanto ouvi-los com clareza. Agora vão, não temos tempo a perder. - Ordenou o belo garoto.
Sem discutir os dois foram até o local indicado e sentaram-se. Sofia puxou as mãos de Sneer para as suas e falou num tom baixo mas firme:
-Por favor, não me entenda mal. Você é incrível: bonito, inteligente, gentil. Em condições normais é tudo que eu posso querer, mas...- as palavras vieram apenas em pensamentos. Grudou fixamente seus olhos azuis nos amendoados dele e paradoxalmente de lá tomou coragem para terminar a frase – mas “nós” só fazia parte do plano.
Contudo o cérebro de Sneer ainda estava no início da frase:
-E as condições não são normais? - as palavras saíram sem a autorização dele.
-Preciso mesmo responder?
-Desculpe, é verdade.- sorriu sem graça. - O problema é Johnny não é? Ele tem essa capacidade de nos manipular para buscar as vontades dele e não as nossas.
Sofia estava confusa, tentou disfarçar o fato de Sneer ter dito exatamente o que estava em seu pensamento:
-Não! Não isso não é certo!. - Porém os olhos dela começaram a lacrimejar, sua voz a tremer. Estava perdida.
-Certo para quem? Errado para quem? Essa definição idiota não deveria existir. Só usamos essa merda para facilitar uma argumentação que não queremos enfrentar, seja por preguiça, ou por saber que seu ponto de vista não faz sentido. É mais facil se omitir, concordando com uma generalização idiota. É mais fácil...
Pela segunda vez na noite suas palavras foram caladas sem serem terminadas. Mas dessa vez, o motivo era algo com o qual ele somente sonhara em seus mais absurdos devaneios. Sofia inclinou-se para frente e beijou-o como nunca havia feito. Com uma vontade e uma paixão só vista por ele uma vez nos lábios de outra garota. Quando as bocas se desvencilharam, tudo que restou a ele para dizer foi:
-Uau – seus olhos se arregalaram e covinhas apareceram em seu sorriso. E covinhas significavam que o sentimento era verdadeiramente forte.
Ainda absorvia tudo aquilo estupefato quando não muito ao longe uma voz conhecida despertou-o:
-Filha-da-puta! - Os cabelos raivosos e a voz flamejante de Linda cortaram gentil e estridentemente o ar.

Música: Admit Defeat - Franky Lee



50 - Charlie
segunda-feira, 14 de setembro de 2009


Charlie saiu discretamente do dormitório masculino. Checou mais uma vez o hálito antes de descer as escadas rumo ao laboratório; vestia uma camisa xadrez em azul e vermelho, uma bermuda lisa bege e um mocassim marrom sem meia. Havia passado gel nos cabelos e na mão trazia um buquê de flores colhidas por ele mesmo.

Chegando a seu destino encostou-se numa parede de modo que pudesse observar o entra e sai do laboratório sem ser visto. Descarregou as tensões e ficou recordando as falas rigorosamente ensaiadas na frente de um espelho. Não precisou esperar muito até que Lichba saísse. Tomou coragem que teimava em escapar-lhe pelas mãos suadas e revelou-se, estendendo as flores para a garota que pareceu surpresa:

-O..obrigada! São lindas – ouvir aquela voz foi o suficiente para que esquecesse tudo o que havia decorado. Ficou encarando-na, tentando pensar em algo para falar , mas em sua mente era povoada somente por geladeiras.

Um silêncio constrangedor tomou conta do local. Ambos sabiam o que queriam dizer, porém nenhum dos dois dizia. Após muito lutar contra sua boca que insistia em tremer e sua voz que insistia em falhar convidou:

-Me acompanha num passeio até o lago? Pensei que talvez gostasse de ver a Lua cheia.

Para o alívio de Charlie, Lichba concordou com um sorriso desnorteante e os dois desceram as escadas sem pronunciar nenhuma palavra. Somente ao sentirem o cheiro convidativo da noite é que a garota falou:

-Está uma bela noite.

Ela era ligeiramente mais alta que Charlie e ele precisou olhar para cima para responder:

-Não tão bela quanto você. - As palavras escapuliram despretensiosas de sua boca.

-O que disse? - Ela havia adorado ouvir aquilo, por isso pediu para que ele repetisse.

Em pane e com medo que seu comentário saísse atrevido demais , Charlie corrigiu:

-Adoro bolo com patê.

Lichba abafou uma risada ao perceber os efeitos colaterais do nervosismo de seu companheiro de caminhada. Resolveu mudar o assunto enquanto os passos avançavam sem pressa:

-Você sabe de tudo que se passa por aqui?

-Conheço tudo como a palma de minha mão. - Mas as palavras saíram abafadas por uma tosse, resquício de uma gripe. Não entendendo nada, a garota perguntou novamente:

-O que?

Achando que Lichba julgara seu comentário por demais pretensioso, mudou-o.

-Menos o que há em seu coração.

Foi quando pararam a beira do lago. A lua refletia romanticamente nas águas escuras. Sem querer perder mais tempo a garota pediu:

-Feche os olhos.

-Você não vai me sacanear né? Colocar terra ou sei lá, porque uma vez, quando eu estava na sétima série...

Mas não pode terminar a história. Algo molhado antingiu docemente sua boca, fazendo-o calar-se imediatamente. Abriu lentamente os olhos e se viu muito próximo da menina, que após algum tempo de beijo confuso e desajeitado declarou-se:

-Você é um fofo!

A êxtase dentro dele era tão grande que ao ouvir o elogio seu coração disparou, sua barriga ficou quente e pode sentir sua testa em chamas. Era melhor do que ele havia imaginado. Os dois passaram a noite á beira do lago, abençoados pela lua e alienados pelo amor.


Música: The Angel and the One - Weezer




49,5 - Misery e os quatro trevos
sexta-feira, 11 de setembro de 2009


Nem um minuto depois Linda e Sofia entraram e ocuparam dois dos lugares, sem no entento conseguir ver Johnny. Não tardou para que Sneer e Meyer chegassem e também se sentassem nas vagas restantes. Este tirava disfarçadamente uma incomoda meleca do nariz. Os olhos daquele brilharam ao ver Sofia, mas nenhuma palavra saiu de sua boca. Estavam ansiosos demais para falar. Todos se viraram para a escuridão quando Johnny pigarreou.

-Que bom que vieram, temos muito o que falar – disse, saindo das trevas – mas temo que o tempo não esteja a nosso lado – seu tom de voz se alterava conforme ia jogando as conjunções – portanto não vou mais enrolar. Como alguns já sabem, meu real nome não é Johnny Fun e sim Gavin Gates. - As garotas não pareceram surpresas, contudo os olhos de Sneer pareciam querer saltar – Mas podem continuar com Johnny, eu prefiro.

Sneer pareceu querer falar, porém, com um gesto da mão Johnny pediu que ele esperasse e retomou a oratória:

-Tive que mudar algumas coisas depois do pequeno incidente na casa do Sneer ano passado, caso não quisesse ir parar atrás das grades – e riu tenso – essa história vocês conhecem bem; o importante é que saibam que eu sou eu.

Fez uma pausa pois sua garganta começava a ficar seca. Não havendo interrupções continuou:
- Quero que tudo o que aconteceu em Misery e que possa atrapalhar o que faremos hoje a noite que fique para trás – Sneer e Linda olharam receosos para Meyer e Sofia, percebendo isso Johnny interviu – Sim, Meyer também esteve lá Sneer; se não me engano vocês cursaram física quântica e engenharia de fluídos na mesma turma do ano passado. - Meyer assentiu com a cabeça espantado – pelo visto não fomos só nós que trapaceamos para entrar no St. Jimmy, mas essa é uma boa história para contar outra hora. - Completou, percebendo que para quase ninguém aquilo parecia fazer sentido, a única exceção era Sofia, que parecia achar a história toda muito entediante.

-Como vocês já devem ter percebido, Lyla não está conosco; isso porque ela foi sequestrada e deve estar agora mesmo no bosque, esperando para nos ver. - Foi até o canto da sala e apanhou um copo com água, esperava que algúem fizesse alguma pergunta, foi Sneer:

-Mas por que? E por quem? O que faremos?

Sorrindo Johnny respondeu:

-Uma pergunta de cada vez: Fionna, uma garota, se é que podemos considerá-la assim. Mas se não me engano ela não está sozinha, alguém mais inteligênte está por trás disso. Creio que você saiba o por que, embora eu vá explicar: não há bomba nenhuma no St. Jimmy, como Lyla logo percebeu, aquilo tudo foi um teatro que o nosso diretor armou e no qual eu contribuí – Linda fuzilou com os olhos, ele gostava de observar a reação da platéia enquanto desenvolvia o show – achei que ajudaria bastante – desculpou-se – mas sim, há algo a ser encontrado. Para ser mais exato, temos 3 milhões de dólares escondidos em algum lugar do colégio e Fionna acha que eu sei onde está – concluiu triunfante.
Linda, agora de volta a sua preocupação, perguntou:

-E você sabe?
- Tanto quanto qualquer outro aqui. - Foram as palavras mágicas para que a ruiva se descontrolasse:

-E agora? A vida da minha irmã está em perigo e a culpa é toda sua, seu filho-da-puta egoísta de merda. - os chingamentos teriam continuado se Sofia não segurasse calmamente a mão de Linda. O gesto pareceu ter efeito imediato, com isso Johnny tornou a falar:

- Obrigado – a palavra que soava estranha saída da boca do garoto foi acompanhada de uma piscadela – Eu tenho um plano. Infelizmente não podemos chegar lá de mãos abanando e implorar pela vida dela. Não, temos que parecer que foi tudo um acidente. Eu vou para lá conforme o combinado com ela, mas vocês precisam fingir que estão lá por uma incrível coincidência, um terrível acidente...

-E por que precisamos todos estar lá? - era a voz de Sneer.

-Não precisam, mas creio que todos aqui se importam fodidamente para querer estar lá e além do mais, ela não vai nos esperar sozinha, quanto maior o número de guerreiros ao nosso lado, melhor. - Sneer e Linda pareceram satisfeitos com a resposta - Voltando ao plano, Sneer e Sofia vão para o bosque, primeiramente fingindo ser nada mais que um lindo casal apaixonado. Quero que se sentem perto da ogra de modo que ela possa ouvir suas vozes. Então Linda chegará e terá um surto psicótico de ciúmes – e olhando para ela acrescentou – sei que você pode fazer isso bem para caralho – Sofia teve que segurar a mão da ruiva novamente para que Johnny pudesse prosseguir – Fionna irá se intrometer e é nessa hora que eu David e Andy entramos em ação. Vamos derrubar os guardas e resgatar Lyla, teremos o elemento surpresa ao nosso lado. Talvez vocês tenham que partir para a briga física, mas isso só vai acontecer se alguma coisa falhar. Alguma dúvida?

Meyer levantou o braço obedientemente e após um gesto de incentivo perguntou:

-E eu?

Ele obviamente não fazia parte do plano, tentando disfarçar isso Johnnt respondeu:

-É... você me segue e garanta que não estamos sendo observados.

Meyer pareceu feliz com a função. Johnny virou-se para os outros agitado:

-Não temos mais tempo a perder, todos prontos? - A tensão no ar era tão grande que era possível engasgar com ela. Sneer, Sofia e Meyer concordaram, mas Linda ainda estava intrigada:

-Você disse que faltava uma folha do trevo e que as outras três estariam aqui – a ruiva fazia um esforço para resgatar corretamente os detalhes da mensagem em sua mente – Eu, você e? Sneer, Meyer?

-Não – sorriu – aliás, foi bom você ter lembrado, eu quase ia me esquecendo – e passou os braõs pelo ombro de Sofia que já estava em pé – Essa é minha meia irmã, Sofia Julia Gates Habsburg.

A garota levantou um pouco a calça de deixou aparecer um trevo de quatro folhas enrolado no tornozelo. Meyer ainda exclamou:

-Ah, isso é tão clichê!


Música: Know Your Enemy- Green Day



49 - Johnny Fun
quarta-feira, 9 de setembro de 2009


Johnny estava sentado sozinho no escuro. Pensou em acender um baseado, mas uma voz pouco ouvida em sua cabeça lhe disse que ele precisava fazer aquilo sóbrio. Concordou a contragosto

Se tudo desse certo e seu plano fosse um sucesso mais uma vez conquistaria o que desejava e as pessoas o achariam um gênio. No entanto pela primeira vez, não sabia com quem estava competindo; envolvera variáveis demais no processo, se tudo não fosse exímeamente bem executado, se por um azar algo falhasse, ele poderia perder mais do que tinha a ganhar. Era um risco a se correr.

Uma batida na porta o tirou de seus pensamentos. Pela altura e força julgou ser Andy. Por isso não moveu nenhum músculo além do necessário para falar:

-Entre.

A porta se abriu deixando uma nesga de luz entrar. Dois vultos adentraram a sala:

-Terei uma conversa particular agora - começou Johnny – Andy, não deixe que ninguem mais se aproxime – o rapaz assentiu com um movimento da cabeça – David, tudo certo no bosque? - Foi a vez do outro garoto concordar. - OK, esperem lá fora, preciso me concentrar para não falar mais que o necessário. Andy, fique de olho na chave, ela agora é mais importante do que nunca; em breve cumprirei com minha parte do acordo. Agora vão, estou ouvindo passos, calculo que sejam as garotas.

Dispos quatro cadeiras num canto da sala e acendeu apenas uma das luzes de modo a se manter invisível na escuridão total.

Era hora de recolocar a máscara, pois só assim poderia tirá-la/


Música: Cold Feelings - Social Distortion




48 - Meyer e Sneer
segunda-feira, 7 de setembro de 2009


Sneer havia acabado de sair do banho. Seu roupão verde limão com bolas azul-anil deixava apenas sua cara pelada e suas canelas finas à mostra. Parou em frente ao espelho e após algumas caretas treinadas que o divertiam começou a arrumar a franja até que esta estivesse perfeitamente de acordo com seu gosto. Apanhou uma lamina de barbear e encheu desnecessáriamente a face de espuma.
Cantarolava apaixonadamente “Have You Ever Seen The Rain?” enquanto fazia a barba inexistente, de modo que não ouviu os tímidos passos que se aproximavam. Sua mente vagava nos olhos de Sofia que insistiam em sair do azul profundo para um verde guaraná e tornar ao azul numa dúvida agradável.
A lamina vagava inutilmente próxima à sua boca quando se materalizou atrás dele Meyer. O susto foi tamanho que forçou o objeto cortante mais do que seria aconselhável, ampliando ainda mais, com um corte sangrento, seu sorriso.
O apelido de Curinga nunca lhe caíra tão bem.
Após muita confusão, sangue e band-aids o acidente foi deixado de lado. Sentado na cama Meyer começou a se desculpar:
-Não foi minha intenção milorde. Por favor, não me puna! - dizendo isso cobriu a cabeça com os braços, protegendo-se de um ataque que não veio. Em seu lugar um sorriso ainda maior que o usual.
Sneer não culpava o garoto por ser tão atrapalhado. Até gostava, fazia-o sentir-se superior. Mas ainda o intrigava o que o trazia ali. Tratou de descobrir:
-Tudo bem, tudo bem. O que você quer?
A resposta confirmou suas piores suspeitas:
-Johnny. Quer te ver.
-E por que eu iria?
-Ele disse que se você perguntasse isso era pra responder: é pelos velhos tempos – e imitou sem sucesso a voz boba e a cara desafinada de Johnny.
-Velhos tempos? - aquilo estava ficando estranho.
-Ele disse que se você dissesse isso era pra falar: o grande filho-da-puta e o Super Cicatriz estão de volta à ativa na missão de resgate da Índia Gorda.
A menção daqueles três apelidos fez os olhos de Sneer se arregalarem. Olhou sonhadoramente para a janela tentando montar o quebra-cabeça, buscando respostas num passado saudoso. Mas como seria possível?
A voz de Meyer tornou a soar:
-Ele disse que se você pensasse nisso era para falar: no St. Jimmy tudo é possível. Eu acrescentaria que em Hogwarts e em Vegas também. - concluiu.
Sem saber o que fazer nem pensar, o Curinga levantou-se e correu para a porta. Ao perceber que não estava sendo seguido virou-se para Meyer e deparou-se com uma cena no mínimo estranha. O garoto estava prestes a saltar da janela. Seriam 7 andares de queda. Explicou-se:
-Se o Batman pode, por que eu não posso?
-Quem disse que você não pode?
Mas até Meyer percebera a ironia na voz de Sneer. Retrucou na mesma moeda:
-Acho melhor você trocar o roupão antes, esse está sujo de sangue.

Música: Have You Ever Seen The Rain - Ramones



47 - Meyer e Linda
sexta-feira, 4 de setembro de 2009


As vezes um pequeno ato pode significar muito. Um elogio ou uma simples demonstração de confiança tem o poder de mudar o dia de outra pessoa, gerando consequências benéficas no futuro. E Johnny Fun sabia disso. Meyer saiu feliz da sala do terceiro andar. Apesar de ainda morrer de medo de Johnny, era a primeira vez na última semana que confiavam a ele uma tarefa. Ele não mandou Andy nem David para fazer aquilo e sim eu, pensava orgulhosamente enquanto subia as escadas do quarto andar aos pulinhos. Sua missão era convocar Sneer e Linda e quem mais o ouvisse enquanto falasse com os dois. Quanto mais melhor, haviam sido as palavras de Johnny. Estranhava as decisões dele, mas não ousara fazer perguntas em voz alta, de modo que agora elas ficavam martelando em sua mente: o fato de Lyla ficar fora da lista era estranho, mas recordando-se dos acontecimentos de dois dias atrás no salão de estar as coisas pareciam fazer um pouco de sentido; já ele ter pedido para que convocasse também Sneer era um mistério total à cabecinha pensante de Meyer. Via os dois como inimigos mortais; a única conclusão a que conseguiu chegar foi que as coisas estavam estranhas por ali. Teve que segurar seus pensamentos pois Johnny dissera que a ruiva estaria no dormitório feminino e este vinha antes do masculino, onde se encontrava Sneer, em seu trajeto. Torceu para que Fionna não aparecesse em seu caminho, era sempre constrangedor encontrá-la. Da última vez que isso ocorrera ele pisara acidentalmente no pé da garota que agarrou-o imediatamente pela gola impecável de sua camisa polo. Arrastou-o até o banheiro mais próximo e enfiou vigorosamente a cara dele numa privada recheada de merda. Ele contou cinco descargas e três banhos para tirar toda aquela sujeira. Não que ele se importasse com o cheiro, até gostava, mas percebeu que as pessoas evitavam ainda mais se aproximar dele, além de apontarem em sua direção com os narizes tapados. Suas preces funcionaram pois o dormitório parecia deserto a primeira vista. Somente quando chegou mais perto é que pode ouvir vozes baixas. Uma delas, que não levou nem dois segundos para que ele identificasse como a de Linda dizia: -Eu não sei, nunca aconteceu comigo antes. Nunca me senti assim, pelo menos não em relação...-as palavras pareceram se perder no caminho. -Tudo bem – cortou a outra voz que era vagamente familiar a Meyer, mas ele tinha certeza de nunca ter ouvido antes – é normal. O sentimento não é nem um pouco estranho pra mim, mas sem dúvida existe desde o começo. As vozes se calaram de súbito. Aproveitou o longo silêncio para entrar sem se anunciar e fazendo o mínimo possível de barulho. Esperava ver alguma delas só de calcinha ou quiçá, se sua sorte fosse tão grande quanto ele sentira ao acordar, completamente nua. E a surpresa veio, não viu exatamente o que desejara, porém aquela era uma cena rara. Linda e uma outro garota, muito próximas, como se estivessem prestes a dar uma trombada em camera lenta, ou pior: a se beijar. Infelizmente, a outra garota, uma bela morena, muito pálida e de olhos tão azuis quanto poderiam ser o viu e imediatamente se afastou, fingindo estar fazendo outra coisa. Flagrado, imediatamente Meyer começou a desculpar-se: -Desculpe Effy, digo, Lisabeth, não Princesa Leia, não! Desculpe-me seja lá quem você for.- palavras e imagens começavam a se embaralhar em sua cabeça – tenho um recado de Johnny. - vendo que, ao mencinoar aquele nome a ruiva desistira de atacá-lo prosseguiu – Ele pediu para que o encontrasse na sala dele. E você – apontou para a outra garota que remexia uma mala a procura de nada pois suas mãos etavam vazias quando as tirou de lá – você pode ir também se quiser, ele disse que quanto mais melhor. A garota fez uma cara de nojo que ninguém entendeu. Linda começou a falar num tom revoltado, típico dela: -Aquele filho-da-puta! Se acha que depois do que aprontou as coisas vão continuar como antes ele está muito enganado! Avise o imbecil que não vou e se caso ele realmente queira falar comigo que venha até mim! Meyer entretanto não se espantou com o sermão. Fora advertido contra aquilo e retrucou ensaiadamente: -Johnny disse que você falaria isso e pediu pra falar que adora seus olhos quando você fica brava. Falou também que uma folha do trevo está faltando e que esperava que as outras três comparecessem para recuperá-la. Aquilo foi um calmante para os animos exaltados da ruiva. Ficou repassando a frase na cabeça, parecia fazer muito sentido; os últimos dois dias haviam sido tão intensos que nem pensara muito no assunto. No entanto um detalhe a incomodava. Resolveu exprimi-lo em voz alta: -Três? Mas Meyer já não estava mais lá.


Música: Duckpond - Millencolin




46 - Charlie, Johnny e geladeiras.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009


Desde que Lichba fora citada em sua última conversa com o misterioso sequestrador, Charlie se dera conta de que já havia passado a hora de agir. O único problema, que o impedia de tomar uma atitude desde o início, era que ele não tinha a mínima ideia de como começar uma relação com a garota. Nunca havia saído com uma e não conseguia pensar no que deveria fazer. Foi quando se lembrou de que conhecia alguém perfeito para ensiná-lo: Johnny Fun.
Foi até o terceiro andar com a intenção de falar com ele, no entanto só encontrou David parado em frente a porta trancada. Foi recebido com um aviso:
-Johnny está ocupado no momento, sugiro que volte mais tarde, deve demorar. - advertiu.
-Sem problemas, eu espero. - Julgou ser uma boa opção, já que não tinha outros planos em mente.
E Charlie esperou. Enconstou-se na parede e esperou. Horas se passaram nas quais só se ouvia e imaginava o que se passava lá dentro. David não se mostrara uma boa companhia e os dois não trocaram mais nenhuma outra palavra. Quando finalmente Charlie adormecera, o som da porta se destrancando tornou a acordá-lo.
Cinco garotas saíram de lá, algumas aos sorrisos, outras semi-nuas e por fim Lichba.
Aquilo fez seu coração acelerar. Ela estava completamente vestida e não apresentava sinais de que estviesse chapada, porém ele conhecia Johnny e o fato dela estar lá dentro com ele já era o suficiente para dar um banho de água fria em suas pretensões.
Foi tirado desse ciúme repentino quando os olhos negros da garota cruzaram os seus. Sentiu-se ruborizar, levantou roboticamente a mão direita num aceno desajeitado, mas de sua boca saíram palavras estranhas para ocasião:
-Vendo geladeira usada, cor branca, tratar comigo.
A frase fez outras duas garotas gargalharem humilhantemente; Lichba no entanto apenas abriu um belo sorriso e se afastou. Charlie ficou observando até que mais nenhuma ponta de seu cabelo black power fosse visível. Por fim se virou e entrou na sala. Johnny iniciou a conversa:
-Sinto em lhe informar mas não estou interessado em geladeiras. Caso tenha algum outro assunto a tratar sente-se e acenda um baseado; caso não boa sorte com Lichba.
Charlie espantou-se com a capacidade de Johnny de ler as pessoas. Abismado disse:
-Como...como você sabe?
-Você ainda está vermelho. Acredite em mim, tenho experiência com garotos vermelhos apaixonados- e fez uma imitação tosca que Charlie reconheceu como Sneer. - Ela é uma boa garota, boa até demais. Deixa a vida passar, não bebe, não fuma, não fode.
Era como se ele insultasse o próprio Charlie usando um vocabulário tão chulo e uma despretensão tão grande tão grande na voz ao tratar de Lichba. Mas o peso que a frase havia tirado de suas costas e o fato de precisar do garoto fizeram com que ele não emitisse qualquer comentário. Adivinhando seus pensamentos novamente, Johnny prosseguiu:
-Então, ela sabe que você existe? - era como um psicólogo agora. Do outro lado da mesa acendeu um cachimbo, entrelaçou os dedos e levantou uma sombrancelha, adquirindo um ar de intelectual que não poderia combinar menos com ele.
-Se ela quiser uma geladeira, acho que sim. - Charlie caçoava da própria desgraça. A risada que veio em seguida foi calada por um carrancudo pigarro.
-Não, aquela troca de olhares não foi besteira. Ela definitivamente sabe que você existe, isso ajuda bastante.
-Como...como você sabe? - No fundo contudo ele já desistira de entender Johnny, o que eu foi bom, pois não houve resposta alguma.
O pálido garoto soltava baforadas em círculos do que houvesse em seu cachimbo e apesar de repetir em voz baixa “eu sou o Gandalf”, seu cérebro parecia estar pensando em outra coisa, pelo menos era o que Charlie esperava. Muitos “Gandalf”s e muita fumaça depois veio o veredicto:
-Não adiantaria espalhar rumores falsos seus por ai, ela não é do tipo garota-influenciável-sedenta-por-sexo. Portanto fale com ela, faça uma visita ao laboratório quando ela estiver de saída. Leve flores, convide-a para um passeio a baira do lago; estamos em lua cheia, isso deve ajudar. Conte para ela como se sente e tente evitar falar de geladeiras ou qualquer outro eletrodoméstico, ela pode achar isso machista. Use perfume e tenha certeza que o hálito está bom. Deixe ela te beijar quando acabar o assunto.- Após dizer isso largou o cachimbo em cima da mesa, olhou para o relógio na parede atrás de Charlie e concluiu:
-Foram 22 minutos. São R$ 83,12. - E estendeu a palma da mão. Ao perceber os olhos arregalados de seu “cliente” disse:
-Brincadeira, boa sorte. Se por acaso você filmar, me mande uma cópia.
Aliviado e assustado Charlie se levantou, mas antes que pudesse sair Johnny fez uma última pergunta num tom de voz preocupado:
-Alguma notícia de Lyla?
-Achei que não fosse perguntar. No bosque, você tem 24 horas. É tudo o que sei – disse apontando para um hematoma no pescoço.
Johnny nem sequer percebeu quando a porta se bateu com força. As engrenagens de seu cérebro trabalhavam a todo o vapor, seu plano havia funcionado.

Música: Pretty Fly for a White Guy - The Offspring