A voz de Linda fez com que o casal se levantasse sincronizadamente. Sneer estava pronto para fazer despertar o artista que havia dentro dele; Sofia, no entanto, não tinha tanta certeza que aquilo tudo era encenação.
Ouviu a ruiva se aproximar, à passadas firmes que faziam a grama gemer, e empurrar Sneer de volta para o banco, onde o garoto ficou obedientemente assistindo à conversa:
-Então era esse o fim que você daria? - a vermelhidão de seus cabelos se espalhava por todo o corpo.
Sofia calou-se por alguns instantes. Estava atordoada. Sentia por Linda uma paixão explosiva, e além do mais havia prometido para a garota que o caso com Sneer não passava de um favor para o irmão. Contudo agora, ela já não estava mais tão certa disso, estar com ele a fazia sentir-se segura em meio àquele caos. Foi o que tentou explicar:
-Eu já não sei mais! Gosto de você e gosto de Sneer... – e apontou para o rapaz que parecia se divertir, para ele aquilo tudo não passava de encenação. - eu não quero ter que escolher, eu quero viver! - conforme falava a morena ia ficando cada vez mais pálida.
Ao ouvir aquelas palavras Linda entrou em choque. O filme se repetia: confiara em alguém, se apaixonara por alguém e essa pessoa frustrara seus sentimentos em tempo recorde. A única diferença é que dessa vez fora trocada por um homem. Indignou-se:
-Eu deveria saber, é mal de família! Maldito o dia em que esses malditos portões se abriram malditamente!
Sofia ficou sem ter o que falar, mas nem precisou, uma voz desdenhosa veio colaborar para a impaciência de Linda:Sneer e Sofia haviam abandonado a sala havia poucos segundos quando Johnny anunciou numa voz decidida:
-Linda, preciso falar com você, acho que lhe devo explicações.
Os dois ficaram olhando impacientes para Meyer que parecia não ter entendido a deixa. Provada a falta de capacidade mental do garoto a ruiva gritou numa voz histérica:
-Tira essa bunda gorda daqui otário!
Sem entender o motivo de tanta raiva o garoto saiu resmungando:
-Ah! Mas que clichê!
Quando a porta tornou a se fechar Johnny deu uma tragada no baseado recém acendido e com a voz disfarçada pela fumaça começou:
-Acho que devo desculpas a você e à Lyla – ao ver que Linda não parecia mais mansa acrescentou - Acredite, foi realmente doloroso pra mim fazer tudo aquilo.
Deu outra tragada e continuou, observando a ruiva impassível:
-Tudo que aconteceu por aqui no últimos dias foi culpa minha. O que rolou comigo, com você, com sua irmã e por que não com a minha e com Sneer foi tudo culpa minha. Mas como você é a mais esperta daqui, espero que se ainda não entendeu, que entenda. - A ruiva permanecia imóvel – tive que fazer com que vocês brigassem, com que nós brigassemos, ela e Sneer brigassem, pois só assim teríamos tranquilidade de uma vez por todas – outra tragada – com ela sendo sequestrada descobrimos o assassino do St. Jimmy, Andy me entrega a chave, pegamos a grana e não precisamos nos preocupar com mais porra nenhuma por um bom tempo. - ele parecia realmente convencido que aquilo fora o tempo todo o certo a se fazer.
Na tentativa de acalmar a fera ainda acresentou:
- Somos cinco. Temos três milhões mais a grana do ano passado. O que acha?
A ruiva tinha os olhos franzidos de raiva. Levantou-se a aproximou-se lentamente de onde estava Johnny. Aproveitando que o garoto olhava fixamente em seus olhos levou a mão até o meio das pernas dele e apertou firmemente o seu saco, até que as unhas cuidadosamente cultivadas por ela estivessem prestes a perfurá-lo. Pode ver os olhos dele começarem a lavrimejar, apesar de não haver qualquer outra manifestação de dor, tensão ou nem mesmo surpresa naquela face pálida. Colocou a boca nos ouvidos dele e sussurrou espinhosamente:
- Acho bom que isso de certo, seu egoísta filha-da-puta – e girou o punho torcendo dolorosamente os testículos de Johnny que por um instante mínimo franziu as sombrancelhas – caso contrário, você vai torcer pra que eu tivesse arrancado suas bolas agora.
Quando as mãos da garota afrouxaram ele soltou um brevíssimo e imperceptível suspiro de alívio. Em seguida, já com o sorriso bobo de volta ao rosto sugeriu:
-Se você descer agora poderá ver os dois se beijando. Ai você cumpre sua parte do plano.
Johnny só tornou a relaxar quando a ruiva sem mais nenhuma palavra virou as costas eabandonou a sala.
Música: Good Ridance (Time of your Life) - Green Day
Charlie saiu discretamente do dormitório masculino. Checou mais uma vez o hálito antes de descer as escadas rumo ao laboratório; vestia uma camisa xadrez em azul e vermelho, uma bermuda lisa bege e um mocassim marrom sem meia. Havia passado gel nos cabelos e na mão trazia um buquê de flores colhidas por ele mesmo.
Chegando a seu destino encostou-se numa parede de modo que pudesse observar o entra e sai do laboratório sem ser visto. Descarregou as tensões e ficou recordando as falas rigorosamente ensaiadas na frente de um espelho. Não precisou esperar muito até que Lichba saísse. Tomou coragem que teimava em escapar-lhe pelas mãos suadas e revelou-se, estendendo as flores para a garota que pareceu surpresa:
-O..obrigada! São lindas – ouvir aquela voz foi o suficiente para que esquecesse tudo o que havia decorado. Ficou encarando-na, tentando pensar em algo para falar , mas em sua mente era povoada somente por geladeiras.
Um silêncio constrangedor tomou conta do local. Ambos sabiam o que queriam dizer, porém nenhum dos dois dizia. Após muito lutar contra sua boca que insistia em tremer e sua voz que insistia em falhar convidou:
-Me acompanha num passeio até o lago? Pensei que talvez gostasse de ver a Lua cheia.
Para o alívio de Charlie, Lichba concordou com um sorriso desnorteante e os dois desceram as escadas sem pronunciar nenhuma palavra. Somente ao sentirem o cheiro convidativo da noite é que a garota falou:
-Está uma bela noite.
Ela era ligeiramente mais alta que Charlie e ele precisou olhar para cima para responder:
-Não tão bela quanto você. - As palavras escapuliram despretensiosas de sua boca.
-O que disse? - Ela havia adorado ouvir aquilo, por isso pediu para que ele repetisse.
Em pane e com medo que seu comentário saísse atrevido demais , Charlie corrigiu:
-Adoro bolo com patê.
Lichba abafou uma risada ao perceber os efeitos colaterais do nervosismo de seu companheiro de caminhada. Resolveu mudar o assunto enquanto os passos avançavam sem pressa:
-Você sabe de tudo que se passa por aqui?
-Conheço tudo como a palma de minha mão. - Mas as palavras saíram abafadas por uma tosse, resquício de uma gripe. Não entendendo nada, a garota perguntou novamente:
-O que?
Achando que Lichba julgara seu comentário por demais pretensioso, mudou-o.
-Menos o que há em seu coração.
Foi quando pararam a beira do lago. A lua refletia romanticamente nas águas escuras. Sem querer perder mais tempo a garota pediu:
-Feche os olhos.
-Você não vai me sacanear né? Colocar terra ou sei lá, porque uma vez, quando eu estava na sétima série...
Mas não pode terminar a história. Algo molhado antingiu docemente sua boca, fazendo-o calar-se imediatamente. Abriu lentamente os olhos e se viu muito próximo da menina, que após algum tempo de beijo confuso e desajeitado declarou-se:
-Você é um fofo!
A êxtase dentro dele era tão grande que ao ouvir o elogio seu coração disparou, sua barriga ficou quente e pode sentir sua testa em chamas. Era melhor do que ele havia imaginado. Os dois passaram a noite á beira do lago, abençoados pela lua e alienados pelo amor.
Música: The Angel and the One - Weezer
Nem um minuto depois Linda e Sofia entraram e ocuparam dois dos lugares, sem no entento conseguir ver Johnny. Não tardou para que Sneer e Meyer chegassem e também se sentassem nas vagas restantes. Este tirava disfarçadamente uma incomoda meleca do nariz. Os olhos daquele brilharam ao ver Sofia, mas nenhuma palavra saiu de sua boca. Estavam ansiosos demais para falar. Todos se viraram para a escuridão quando Johnny pigarreou.
-Que bom que vieram, temos muito o que falar – disse, saindo das trevas – mas temo que o tempo não esteja a nosso lado – seu tom de voz se alterava conforme ia jogando as conjunções – portanto não vou mais enrolar. Como alguns já sabem, meu real nome não é Johnny Fun e sim Gavin Gates. - As garotas não pareceram surpresas, contudo os olhos de Sneer pareciam querer saltar – Mas podem continuar com Johnny, eu prefiro.
Sneer pareceu querer falar, porém, com um gesto da mão Johnny pediu que ele esperasse e retomou a oratória:
-Tive que mudar algumas coisas depois do pequeno incidente na casa do Sneer ano passado, caso não quisesse ir parar atrás das grades – e riu tenso – essa história vocês conhecem bem; o importante é que saibam que eu sou eu.
Fez uma pausa pois sua garganta começava a ficar seca. Não havendo interrupções continuou: Johnny estava sentado sozinho no escuro. Pensou em acender um baseado, mas uma voz pouco ouvida em sua cabeça lhe disse que ele precisava fazer aquilo sóbrio. Concordou a contragosto
Se tudo desse certo e seu plano fosse um sucesso mais uma vez conquistaria o que desejava e as pessoas o achariam um gênio. No entanto pela primeira vez, não sabia com quem estava competindo; envolvera variáveis demais no processo, se tudo não fosse exímeamente bem executado, se por um azar algo falhasse, ele poderia perder mais do que tinha a ganhar. Era um risco a se correr.
Uma batida na porta o tirou de seus pensamentos. Pela altura e força julgou ser Andy. Por isso não moveu nenhum músculo além do necessário para falar:
-Entre.
A porta se abriu deixando uma nesga de luz entrar. Dois vultos adentraram a sala:
-Terei uma conversa particular agora - começou Johnny – Andy, não deixe que ninguem mais se aproxime – o rapaz assentiu com um movimento da cabeça – David, tudo certo no bosque? - Foi a vez do outro garoto concordar. - OK, esperem lá fora, preciso me concentrar para não falar mais que o necessário. Andy, fique de olho na chave, ela agora é mais importante do que nunca; em breve cumprirei com minha parte do acordo. Agora vão, estou ouvindo passos, calculo que sejam as garotas.
Dispos quatro cadeiras num canto da sala e acendeu apenas uma das luzes de modo a se manter invisível na escuridão total.
Era hora de recolocar a máscara, pois só assim poderia tirá-la/
Música: Cold Feelings - Social Distortion
As vezes um pequeno ato pode significar muito. Um elogio ou uma simples demonstração de confiança tem o poder de mudar o dia de outra pessoa, gerando consequências benéficas no futuro. E Johnny Fun sabia disso. Meyer saiu feliz da sala do terceiro andar. Apesar de ainda morrer de medo de Johnny, era a primeira vez na última semana que confiavam a ele uma tarefa. Ele não mandou Andy nem David para fazer aquilo e sim eu, pensava orgulhosamente enquanto subia as escadas do quarto andar aos pulinhos. Sua missão era convocar Sneer e Linda e quem mais o ouvisse enquanto falasse com os dois. Quanto mais melhor, haviam sido as palavras de Johnny. Estranhava as decisões dele, mas não ousara fazer perguntas em voz alta, de modo que agora elas ficavam martelando em sua mente: o fato de Lyla ficar fora da lista era estranho, mas recordando-se dos acontecimentos de dois dias atrás no salão de estar as coisas pareciam fazer um pouco de sentido; já ele ter pedido para que convocasse também Sneer era um mistério total à cabecinha pensante de Meyer. Via os dois como inimigos mortais; a única conclusão a que conseguiu chegar foi que as coisas estavam estranhas por ali. Teve que segurar seus pensamentos pois Johnny dissera que a ruiva estaria no dormitório feminino e este vinha antes do masculino, onde se encontrava Sneer, em seu trajeto. Torceu para que Fionna não aparecesse em seu caminho, era sempre constrangedor encontrá-la. Da última vez que isso ocorrera ele pisara acidentalmente no pé da garota que agarrou-o imediatamente pela gola impecável de sua camisa polo. Arrastou-o até o banheiro mais próximo e enfiou vigorosamente a cara dele numa privada recheada de merda. Ele contou cinco descargas e três banhos para tirar toda aquela sujeira. Não que ele se importasse com o cheiro, até gostava, mas percebeu que as pessoas evitavam ainda mais se aproximar dele, além de apontarem em sua direção com os narizes tapados. Suas preces funcionaram pois o dormitório parecia deserto a primeira vista. Somente quando chegou mais perto é que pode ouvir vozes baixas. Uma delas, que não levou nem dois segundos para que ele identificasse como a de Linda dizia: -Eu não sei, nunca aconteceu comigo antes. Nunca me senti assim, pelo menos não em relação...-as palavras pareceram se perder no caminho. -Tudo bem – cortou a outra voz que era vagamente familiar a Meyer, mas ele tinha certeza de nunca ter ouvido antes – é normal. O sentimento não é nem um pouco estranho pra mim, mas sem dúvida existe desde o começo. As vozes se calaram de súbito. Aproveitou o longo silêncio para entrar sem se anunciar e fazendo o mínimo possível de barulho. Esperava ver alguma delas só de calcinha ou quiçá, se sua sorte fosse tão grande quanto ele sentira ao acordar, completamente nua. E a surpresa veio, não viu exatamente o que desejara, porém aquela era uma cena rara. Linda e uma outro garota, muito próximas, como se estivessem prestes a dar uma trombada em camera lenta, ou pior: a se beijar. Infelizmente, a outra garota, uma bela morena, muito pálida e de olhos tão azuis quanto poderiam ser o viu e imediatamente se afastou, fingindo estar fazendo outra coisa. Flagrado, imediatamente Meyer começou a desculpar-se: -Desculpe Effy, digo, Lisabeth, não Princesa Leia, não! Desculpe-me seja lá quem você for.- palavras e imagens começavam a se embaralhar em sua cabeça – tenho um recado de Johnny. - vendo que, ao mencinoar aquele nome a ruiva desistira de atacá-lo prosseguiu – Ele pediu para que o encontrasse na sala dele. E você – apontou para a outra garota que remexia uma mala a procura de nada pois suas mãos etavam vazias quando as tirou de lá – você pode ir também se quiser, ele disse que quanto mais melhor. A garota fez uma cara de nojo que ninguém entendeu. Linda começou a falar num tom revoltado, típico dela: -Aquele filho-da-puta! Se acha que depois do que aprontou as coisas vão continuar como antes ele está muito enganado! Avise o imbecil que não vou e se caso ele realmente queira falar comigo que venha até mim! Meyer entretanto não se espantou com o sermão. Fora advertido contra aquilo e retrucou ensaiadamente: -Johnny disse que você falaria isso e pediu pra falar que adora seus olhos quando você fica brava. Falou também que uma folha do trevo está faltando e que esperava que as outras três comparecessem para recuperá-la. Aquilo foi um calmante para os animos exaltados da ruiva. Ficou repassando a frase na cabeça, parecia fazer muito sentido; os últimos dois dias haviam sido tão intensos que nem pensara muito no assunto. No entanto um detalhe a incomodava. Resolveu exprimi-lo em voz alta: -Três? Mas Meyer já não estava mais lá.
Música: Duckpond - Millencolin