Lyla estava num lugar estranho. De repente não havia mais som, não havia a rocha, nem os pequeninos musgos que lá moravam, não havia o mar e sua brisa cheirosa, a floresta ou a borboleta alienígena; tudo aquilo havia sumido. Agora ela se encontrava num ambiente no mínimo divertido. Figuras geométricas se alternavam nas paredes, tingidas com cores saltitantes e vibrantes nunca antes vistas pela garota; Sneer iria gostar daquilo.
Passeou pelo cômodo que não tardou a constatar que era triângular. Sentiu-se presa. Não pode ver até que altura subiam as paredes, mas elas pareciam convergir no além, formando uma pirâmide.
Estava insegura, com medo. Teria morrido? Ou apenas desmaiara? Talvez uma alucinação real demais para ser descartada? Ou ainda uma mistura das três coisas? Não sabia dizer, uma voz veio auxiliá-la:
-Lyla?
A loira olhou para trás. Um quadro brotara em meio ao turbilhão de cores. Ela se aproximou:
-Sneer? - definitivamente era o garoto lá dentro – Onde estamos? Todas essas cores, deveria ter imaginado que era alguma coisa sua. Acabe logo com isso, precisamos voltar.
O menino ignorou a maioria do que ouviu e apenas respondeu:
-Apesar de ser de incrível bom gosto, estamos na sua cabeça. Onde mais estaríamos? - Aquilo deveria ser muito óbvio.
-E como eu vim parar aqui? O que você faz aqui? Como saio daqui?
-Se alguém sabe os detalhes sobre uma cabeça é a dona da cabeça. Mas não se preocupe com tanto. O que você precisa você conhece; o resto é inútil.
-É – concordou Lyla, aquilo era verdade. Não sabia o porque, mas já que estava ali iria aproveitar – Me desculpa. Nunca fiz a gente dar certo.
-Não tem problema – os olhos apertados do garoto eram reconfortantes – não era pra dar certo mesmo. Estou aqui como amigo, você precisa entender isso pra se libertar.
Um cronômetro começou a piscar em algo que lembrava um vermelho enjoado acima do quadro. Assim que o zero tomou conta da pequena tela o quadro rodopiou e desapareceu. Em seu lugar apareceu um cícrculo roxo ou laranja. Lyla ainda implorou:
-Espere!
A resposta veio, contundo em outro lugar e numa voz diferente:
-Ele se foi, o tempo dele acabou, mas logo volta. Sempre volta.
Era Linda. A voz da irmã fez os pelos do braço de Lyla se levantarem. Virou-se e deparou-se não com a ruiva explosiva, mas sim com uma loira sorridente de cabelos pouco mais curtos que o dela e com um único e solitário piercing de argola no nariz:
-Linda! Você também está aqui!
-Eu vou sempre estar com você, nada vai mudar isso. Não importa o quanto forem diferentes nossos caminhos, sempre estaremos juntas.
Era estranho ouvir a agora não mais ruiva falar daquele jeito, porém Lyla não deu importância para aquilo. A simples presença da irmã foi o suficiente para fazer marejar seus olhos. As lágrimas atingiram seu máximo quando um telão apareceu logo acima do quadro.
Duas meninas de um loiro quase branco com uns 8 anos de idade choravam abraçadas. Uma mulher mais velha se aproximou delas e perguntou:
-Lyla, por que está chorando?
-Porque a Linda está, mamãe.
A mulher virou-se para a outra garotinha:
-E por que você está chorando Linda?
-Por que a Lyla também está, mamãe.
A mulher sorriu e o telão se foi. O quadro desaparecera, as lágrimas não.
Ainda chorando a loira virou-se para a parede restante. Um grande trevo de quatro folhas brilhava lá. Sentiu seu pescoço fazer o mesmo. Não se surpreendeu quando um terceiro quadro surgiu e retratado nele um garoto loiro, com um sorriso bobo e olhos tão azuis quanto poderiam ser dos quais so dela não ousavam desgrudar. A sensação era divertida, como se o medo fosse embora, como se ela fosse capaz de qualquer coisa:
-E você é. - confirmou o lindo garoto.
-Como você sabe o que eu estava pensando?
-Estamos em sua cabeça, o que você pensa aparece escrito.
-Devo te chamar de Johnny ou de Gavin?
-Meu nome não é Johnny. Quem você ve aqui?
-Não sei, eu vejo você e você é Johnny e Gavin.
-Meu nome não é Gavin. Sou os dois, não sou nenhum. Você é a única que entende isso, sempre foi. Consegue olhar dentro dos meus olhos e realmente ver o que há lá. As coisas podem não estar bem agora, mas isso não significa que não terminarão bem. No fim será sempre eu e você, baby. Nunca se esqueça disso.
E ele se foi. Lyla contemplou sua mente; tinha ali tudo o que precisava : amor em todas as suas formas. Sentia-se muito confortável ali, entretanto era hora de voltar.
A pirâmide foi adquirindo diferentes dimensões até que Lyla não pode mais contá-las. Sentiu algo molhado. Abriu os olhos e murmurrou:
-Parem de me lamber.
Funcionou.
Música: Read My Mind - The Killers